13.7.08

O modelo matricial da Universidade do Minho

No quadro da revisão dos Estatutos da Universidade do Minho, o Plenário do Conselho do Instituto de Ciências Sociais pronunciou-se sobre um conjunto de matérias em avaliação. É sobre a discussão havida sobre o modelo matricial e a posição do Instituto que versa o texto que segue.

É o modelo matricial que na Universidade do Minho determina a sua estrutura de funcionamento, seja em termos pedagógicos e científicos, seja em termos administrativos. Todavia, o modelo adoptado não tem tido uma leitura unívoca, tendo mesmo zonas de sombra, nunca esclarecidas, razão pela qual a sua invocação nunca foi confortável, sendo até polémica muitas vezes.

Se pensarmos o modelo matricial do ponto de vista da racionalização organizativa, as vantagens da partilha de recursos por ele promovida parecem benefício capaz de superar os malefícios da centralização e da perda da individualidade, diversidade e flexibilidade, a que obriga o tratamento centralizado e concentrado de muitas matérias. O modelo sofreu, todavia, a este nível, uma inflexão que o perverteu e disfuncionalizou. É manifesto hoje um grande distanciamento entre os Serviços e as Unidades, mostrando-se a estrutura muito pouco flexível, a ponto de ter deixado de responder às especificidades das Unidades Orgânicas. Ao que parece, alguns Serviços transformaram-se mesmo em instâncias de controle administrativo, em instâncias-tampão da fluidez da vida universitária, que as Escolas representam, negando a verdadeira razão da sua existência, o serviço da Universidade no apoio aos seus projectos pedagógicos, científicos e de extensão. Além disso, acontece muitas vezes uma duplicação pelos Serviços e Escolas de estruturas com funções equivalentes, tendo os Serviços deixado, todavia, de exercer as competências que lhes estão formalmente atribuídas pelo Regulamento Orgânico da Universidade. As Escolas, é um facto, têm sido formalmente esvaziadas de competências, mas é sobre elas que, por norma, recaem os encargos e a solução dos problemas, não ocorrendo todavia uma correspondente transferência de recursos. É nos Serviços, e não nas Escolas, que se encontram 60% dos funcionários da Universidade!

E vejamos o que aconteceu ao modelo matricial na aplicação que dele fizemos à nossa prática científica e pedagógica. O uso que lhe temos dado tem sido um uso cada vez mais retórico. Invocamos a sua existência ritualmente, como quem se reclama de uma idade mítica, a das origens imaculadas, ou a que deitamos mão, como argumento definitivo, quando importa fechar o debate. Uma vez respeitado o uso retórico do modelo matricial, tudo o mais é possível fazer na Universidade do Minho. Por norma, o modelo matricial satisfaz-se como uma homenagem (e um tributo) que o vício presta (e paga) à virtude. Com uma, duas ou três cadeiras semestrais, num plano de estudos de trinta e seis, postas a concurso fora do Departamento responsável por uma determinado projecto de ensino, o problema da matricialidade fica, por regra, resolvido. Os nossos primeiros ciclos adaptados a Bolonha estão aí para o confirmarem.

Alguns exemplos do que foi possível fazer na Universidade do Minho com o modelo matricial. Hoje, na UM, as Ciências Sociais não estão apenas no ICS. Estão, sim, por todo o lado, da Engenharia, ao IEC, à Economia e Gestão, à Educação e às Letras, não tendo a adopção do modelo matricial impedido que ele tenha sido transgredido nuns casos e pervertido em muitos outros.

Em boa lógica, Ciências Políticas e Relações Internacionais poderiam estar nas Ciências Sociais, e não na Escola de Economia e Gestão. Por sua vez a História, seguindo a tradição da Escola dos Annales, está bem nas Ciências Sociais. Mas não estaria pior nas Letras, uma vez observada a realidade dos seus projectos de ensino e investigação.

Entretanto, o Instituto de Letras empreende hoje o caminho das Ciências da Comunicação. E a mesma coisa acontece com a Engenharia, que também agora o tem feito, depois de ter travestido e se ter apropriado de disciplinas de Economia, Gestão, Sociologia, entre outras. Sendo verdade que o modelo matricial tem permitido celebrar, até hiperbolicamente, os ganhos com a racionalidade dos recursos, não é menos verdade que esse mesmo modelo não impediu que se tenha erguido na UM um monumento que celebra a sua ruína. Com efeito, foram aqueles que na Universidade mais se distinguiram na defesa do modelo matricial quem impôs na estrutura da UM duas Escolas de Educação.

O nosso modelo matricial tem, de facto, um problema na matriz, uma demasiado vasta fragmentação por Escolas, que são de grandeza muito diversificada. E Escolas de dimensão tão variada têm impedido o funcionamento sadio da Academia, com uma Escola hegemónica a impor sempre sozinha o mesmo rumo e a mesma feição à Academia. Além disso, em condições de hegemonia, os grandes na matriz sempre fizeram o que quiseram com o modelo matricial. Têm-no invocado, sempre que lhes convém. Mas de igual modo romperam com ele, quando nisso viram algum interesse.

5.7.08

Uma grande paródia pelo São João, com mordomos, zabumbas e descantes.

Agora, pelo São João, houve eleições na UM para escrutinar os representantes dos funcionários, que deveriam ter assento nos órgãos superiores da Universidade, Senado e Assembleia. Depois que o Tribunal anulou as eleições, os órgãos passaram a funcionar sem representantes deste corpo da Universidade. Há um ano, as eleições haviam contado com uma lista de funcionários, chefes de serviços, afectos à Reitoria. Essses funcionários, ao perderem as eleições, levaram o caso a Tribunal. Pediram a repetição do acto eleitoral, dado o facto de terem cometido erros processuais nas eleições que organizaram. As eleições foram, pois, repetidas, com nova derrota, assinale-se, dos chefes de serviços.

As circunstâncias que rodearam o novo acto eleitoral, bizarras umas, caricatas outras, levaram-me a escrever o seguinte texto, que divulguei na rede interna da UM, nas vésperas da eleição.

Os mordomos juntaram-se para organizar a festa dos zabumbas. Nomearam uma comissão, bem à medida, e convocaram todos os bombos para a festa. Como era de uso, os bombos deveriam afinar o tom pelo ram-ram de um reco-reco e a melodia deveria ser de uma nota só. Mas os bombos entraram em rebelião e não quiseram a festa dos mordomos. Deixaram de ter paciência para as cantigas, sem graça, que repetiam uma nota só. A comissão decidiu multiplicar os bombos como peixes no Mar da Galileia. Lançou redes para mais de oitocentos bombos, embora não houvesse mais do que seiscentos. Mas até com redes meio vazias, se esperava uma pesca messiânica, com as redes a rebentar de bombos.

O que valeu aos zabumbas foi a inesperada intromissão de um romeiro, que nunca foi em cantigas de ram-ram, reco-reco e nota só, e que desconfiou da festa organizada pelos mordomos. O romeiro bateu o pé, e não sendo possível exterminá-lo, o remédio foi mesmo os mordomos meterem a viola no saco e adiarem a festa. Foi por essa altura que os bombos entraram em alvoroço e fizeram uma festa sem mordomos. Encheram as ruas de melodia e foram para os salões de baile, volteando em danças ousadas e fazendo uso de um reportório variado de descantes.

Os mordomos não se ficaram. Queriam para os zabumbas uma festa à sua maneira. Era preciso suster aquele alvoroço das ruas e dos salões de baile. A haver festa, teria que ser de uma nota só. Foram queixar-se ao Juiz. E para levarem a sua avante, usaram de dissimulação. Ora, se há coisa que os mordomos sabem é o uso da dissimulação. Haviam feito o mal; fariam agora a caramunha. Foram então queixar-se ao juiz de que haviam organizado mal a festa, pelo que o alvoroço que havia nas ruas e nos salões de baile não podia valer. A festa das ruas e dos salões de baile não estava organizada consoante as regras. Havia que reconduzir os zabumbas à melodia de uma nota só.

Jogada de mestre. Os mordomos haviam organizado a festa dos zabumbas, mas como eles não alinharam pelo ram-ram do reco-reco e fizeram estoirar a melodia de uma nota só, queixavam-se ao Juiz de que se enganaram a organizar a festa. Um a um, foram passando pelo Tribunal os vários mordomos e os membros da comissão de festas. Todos afinados na dissimulação. «Sim, Senhor Doutor Juiz, nós organizámos mal a festa, que deveria ser de uma nota só. A festa que os zabumbas fazem não deve valer, porque quem decide das festas e do modo de tocar, de cantar e de dançar somos nós. Sem nós e a nossa melodia de uma nota só, a festa dos zabumbas é careta».

O Juiz aquiesceu. E fez muito bem. Festas para os zabumbas quem as deve organizar são os mordomos. Se os zabumbas quiserem cantar, devem fazê-lo sempre pianinho e numa melodia de nota só. E se a festa é outra, é porque o processo está errado. Os mordomos compuseram um ar severo. «É isso, Senhor Doutor Juiz, se estamos aqui é porque temos o sentido da responsabilidade, organizámos mal a festa, mas estamos dispostos a emendar a mão».

O Juiz mandou parar o baile, mas estabeleceu um prazo de noventa dias para o fazer. E decidiu também que os mordomos recomeçassem do princípio os preparativos da festa. Quem tenha olhado as coisas sem bem reparar, facilmente se convenceu de que os mordomos obedeceram à sentença do Juiz. Mas os mordomos são muito sabidos, pelo que apenas fizerem de conta que obedeciam. Para darem uma verdadeira lição aos zabumbas e lhes ensinar que as festas autorizadas são sempre de uma nota só, pararam a música logo no primeiro dia e empurraram-nos com violência para fora do salão de baile. Além disso, entenderam que nem sequer valia a pena repetir os preparativos da festa. Para o que importava mesmo, que era pôr os zabumbas a tocar a cantiga de uma nota só, serviria bem a cena final de um teatrinho de reis e bobos da corte, que prolongasse a festa de São João e o seu espírito de martelinhos e de alho-porro.

Os mordomos fixaram a festa para um dia a seguir ao São João. E ainda pensaram pedir de empréstimo uns gigantones e uns cabeçudos para integrarem a comissão de festas. Mas, reconsiderando, acharam que não valia a pena. A comissão tinha um larguíssimo traquejo na organização de festas de uma nota só e sabia muito bem como afinar os zabumbas pelo ram-ram de um reco-reco. O que a havia tramado antes fora um romeiro, que sem ter sido para lá chamado, se intrometera na organização da festa. Mas desta vez a comissão podia descansar. A festa só contava com mordomos e zabumbas. Nada poderia, pois, atrapalhar os trabalhos da comissão. Tão certa disso estava que até já havia encomendado o fogo. Também só morteiros de um estoiro só.

Os mordomos fizeram bem. Mesmo muito bem. Nunca, em largos anos, se dera pela presença dos zabumbas nas ruas e nos salões de baile. Até chegou a haver quem desconfiasse que eles fossem pés de chumbo, porque sempre tinham sido vistos amarrados ao cantochão do ram-ram de um reco-reco. Mas nos últimos tempos, os zabumbas haviam-se completamente transfigurado, passando a voltear pelos salões de baile em passos de dança variados. E a todos haviam surpreendido, cantando polifonicamente sonatas de grande qualidade melódica. Os mordomos viram bem o perigo que corriam, quando deixou de se ouvir o seu ram-ram de uma nota só. Tirar o pio aos zabumbas, logo na abertura do prazo dos noventa dias fixados pelo Juiz, era uma medida que se impunha e que apenas pecava por tardia.

Quando no salão de baile houve quem estranhasse a ausência dos zabumbas, um elegantíssimo bailarino, destro como ninguém na arte do reco-reco e das cantigas de uma nota só, colocou um ar grave e disse: «Vamos esquecer os zabumbas e as suas danças e descantes. Vamos tirá-los da fotografia deste salão. Como eles nunca aqui deveriam ter entrado, podemos decretar que eles nunca aqui estiveram».

Ouviram-se aplausos no salão de baile. A proposta, de tão airosa, maravilhou meio mundo. E foi assim que os mordomos puderam voltar ao sossego da sua cantiga de uma nota só, bem afinada pelo ram-ram de um reco-reco.

Parir abaixo de zero. Morra a Praxe! Morra! Pim.

Existe um enigma difícil de entender no dia-a-dia das Universidades, muito particularmente no dia-a-dia da Universidade do Minho. Refiro-me à praxe. Olhando o que nos é dado ver nos campi todos os dias, dir-se-á que a Universidade tem mesmo uma vocação de batráquio. Dir-se-á que a Academia do que precisa menos é de um imaginário sadio para respirar à vontade. Poder-se-á dizer também que a praxe na UM não é dissociável do lixo, que é hoje a paisagem obrigatória e uma figura maior do nosso quotidiano. O lixo é ambiental, e tanto constitui o nosso ambiente físico, como o nosso ambiente mental. Tornado coisa natural, o lixo faz hoje parte das evidências do nosso mundo. Deste modo, não parece drama nenhum que o lixo ganhe também a Universidade e o seu imaginário; não parece drama nenhum que a casa da cultura e da ciência e de todas as literacias se atole em lixo. E, no entanto, o lixo é o efeito de uma sociedade sem exigência, anémica e tíbia, que já está por tudo e que a tudo encolhe os ombros. O lixo é um programa para embrutecer à vontade. E o imaginário imbecil e boçal que o entretece serve às mil maravilhas a bestazinha, que habitualmente se encontra bem acachapada em nós, mas que agora tem liberdade para correr em devastação a bom galope.

Escrevi um texto em Maio passado, declinando este tema, que publiquei na imprensa regional e que reproduzi também na rede interna da UM. Ei-lo.

Estamos em Maio, o mês das rosas e o mês de Maria. O mês que também o é da Gata. O ano inteiro a praxe percorre a Universidade em devastação. E são meses e meses de cultura de caserna e de sarjeta. Meses e meses a parir abaixo de zero. Mas estamos em Maio, que é na Universidade um mês verdadeiramente esquizofrénico, um mês de apoteóticas paradas de estudantes, mobilizados e enquadrados por grunhos, que mais parecem celebrar um reinado das trevas, com as suas danças macabras de chacais. Vamos continuar a calar-nos diante do «sacrossanto Cabido», de «bispos, cardeais e papas», que hoje assola o campus universitário?

Houve um tempo em que o país se resumiu a um quartel, uma prisão e um seminário. Vivia-se «habitualmente». Mas apenas na aparência é anacrónica a presente habitualidade do campus universitário. Bem pode, no entanto, o Ministro do Ensino Superior apontá-la a dedo como «prática fascista». Parir abaixo de zero é hoje uma habitualidade que segue impante na Universidade, em cortejo de rebanho humano, de verme a remexer a terra, de manada conduzida pela arreata. Do cantar do galo ao sol-pôr, o campus encena o ano inteiro esta habitualidade de caserna, esta pedagogia boçal, de aprender a dobrar a cerviz. A toda a hora, hordas de sargentos lateiros, fardados à urubu, refastelam-se em seus festins, cobrindo de negrume a Academia, pela reactivação incessante do jogo dos tiranos.

Quem disse que a Universidade é hoje a casa da cultura? E a casa das ideias? E a da ciência? Quem disse que as suas lições são lições de humanidade, liberdade e cidadania? Olhando a caserna e a latrina, que lições são essas onde chafurdam vermes, turbas em vertiginosa descida aos infernos, numa viagem sem fim ao reino da degradação, devorando tudo o que seja sentido crítico, elevação e decência humana?

A resposta vem inteira no Testamento da Gata, um documento único, em que a Associação Académica explica de que espírito são feitas as suas festas. A Academia entretém-se nos seus muitos afazeres. Mas entretém-se mal, porque conivente, à espera que passe depressa esta onda má, que todavia não acaba nunca. Faz muito mal a Academia em se dar a este descuido. O Testamento da Gata é um portentoso monumento erigido à estupidez humana. Perpassa-o uma linguagem cavernosa, de degredo, uma linguagem de sub-mundo, da mais pura cretinice, uma linguagem carroceira e sebenta.

Interrogo-me, todavia, sem atinar com a resolução do enigma. Penso que seria muito interessante saber do Hospital de São Marcos o número de estudantes em coma alcoólico, registados nos serviços de urgência na semana da Gata. E, de igual modo, penso que seria de grande utilidade saber o número de agressões e de desacatos participados à Polícia nessa mesma semana. Mau grado o enigma permanecer inteiro. Por que razão abençoa a Reitoria esta estética fascista? E por que razão os estudantes se deixam comandar por este sub-mundo viscoso, onde, ufana, viceja a podridão? E, sobretudo, como pode a Academia estar por tudo, entretida, calada, pusilânime?

A Assembleia Estatutária e a retórica da democracia, da convergência e do consenso

Chegaram ao fim na UM os trabalhos da Assembleia Estatutária, que conduziram a novos Estatutos. Nas decisões fundamentais, sempre que houve votações formais, impôs-se a lógica da convergência estratégica entre a lista dos professores afectos à Reitoria e a lista da Associação Académica. Mas foi bem significativo na Assembleia o trabalho daqueles professores que na Universidade representam uma visão não tecnocática e não gestionária, uma visão fundada nos valores da liberdade e da cidadania.

No texto que segue, reproduzo os meus comentários, divulgados na rede interna da UM, depois das primeiras votações. Estávamos a um de Abril do ano em curso.

Foi votada na Assembleia Estatutária (AE) a natureza e a constituição do Senado. Por nove votos contra sete, a lista da Reitoria e da Associação Académica impôs um Senado de natureza exclusivamente pedagógica e científica, e também um Senado sem funcionários.

Nos termos estritos da Lei, a Universidade do Minho podia ter dispensado um Senado. Mas não o quis fazer. Compreende-se, o Senado foi parte da sua história de governo, embora nas novas circunstâncias não possa ser outra coisa que um órgão consultivo. A existir um Senado, todavia, deveria ser um órgão de representação de todos os interesses expressivos da Universidade: interesses pedagógicos, científicos, culturais e disciplinares. Porque a autonomia académica se estende a todos estes níveis, ficando diminuída, se amputada de um deles. A operacionalidade do órgão aconselhava, entretanto, além do seu funcionamento em plenário, um funcionamento por comissão especializada. E depois, a insistir-se na ideia de um Senado, deveria este ser um órgão de coesão dos vários sectores da Universidade, com professores, alunos e funcionários.

Mas não será assim. A lista da Reitoria e da Associação Académica impôs uma ideia de Senado que o torna um órgão burocrático, de representação de cúpula, um órgão de inerências, sem professores nem alunos eleitos, para tratar dos interesses científicos e pedagógicos da Universidade. Será um órgão de Professores Catedráticos, Presidentes de Escola, e de alunos burocratas não eleitos, um órgão que injustamente exclui os funcionários.

Nenhum elemento externo da AE votou favoravelmente esta proposta, o que é deveras esclarecedor. Não haviam sido consideradas as propostas da lista B, nem as propostas dos funcionários, expressas no Senado, e também em documento autónomo enviado à Assembleia. E, a meu ver, tiveram razão os elementos externos, é absolutamente imprestável um Senado que não tenha carácter convergente e consensual quanto à sua natureza e constituição.

Espanta, todavia, tamanha soberba. «Somos nós quem trabalha; somos nós quem prepara os textos dos trabalhos da AE; são os nossos textos que são analisados». E mais: «somos nós quem tem a visão clara; aos outros ninguém os entende». E ainda, «o sentido de responsabilidade temo-lo nós; os outros são uns madraços, que se embrulham em fumaça e pirotecnia».

Uns valentões, estes nossos colegas! Mas eu diria que não dói menos ao olhar a indigente estreiteza de vistas que os acompanha. Forçar votações de margem mínima sobre questões estruturais da Universidade é um erro, porque não há meio de assim convencerem a Academia.

E o que é que pode justificar esta vertigem de a todo o custo nos quererem empurrar para um Programa rejeitado em eleições, depois de perdido o combate das ideias? Todos sabemos qual é a regra da democracia, quem decide sobre o melhor argumento é sempre a maioria, quando as eleições são abertas, de voto nominal e universal. O que é que pode justificar então modos tão assanhados, que na sua voragem não atendem sequer a uma vírgula ou a um ponto de interrogação?

Ficou demonstrado, entretanto, o que era já do conhecimento de todos, que o papel da Associação Académica na Universidade do Minho é apenas o de amparar a Reitoria no controle das decisões fundamentais. Houve eleições de docentes para os órgãos superiores da Universidade. E também houve eleições de funcionários para os mesmos órgãos. Houve ainda eleições para a assembleia estatutária. Em todas estas eleições o mesmo resultado: a derrota das ideias e das listas da Reitoria. No entanto, por artes mágicas, sempre a Reitoria pôde sobrepor-se à vontade da Universidade. Da cartola sempre saiu uma coelhinha. E sempre a mesma coelhinha. A Associação Académica.

Falta-me ainda uma vírgula neste trabalho de casa, que é também um exercício de memória. Recapitulo, então. A Reitoria entregou à Associação Académica a eleição dos representantes dos alunos na AE. Na altura, muito boa gente não compreendeu por que razão não havia uma comissão eleitoral única a presidir às eleições, com professores e alunos, sendo o objectivo o mesmo para todos e a situação extraordinária. Claro que hoje não subsistem quaisquer dúvidas. Mas é duvidosa a representatividade de eleições que exprimem apenas 10% a 15% do universo eleitoral, como é o caso das eleições organizadas pela Associação. E não há decoro em eleições cuja comissão eleitoral é designada pelo Presidente da Associação, para decidir em causa própria, sendo ele também candidato numa lista por si constituída. E é mesmo preciso muita lata para a comissão eleitoral da Associação Académica anular a lista que se lhe opôs, com a cumplicidade do Reitor.

Uma nota final. Sem dúvida que é de sucesso e de qualidade a nossa Universidade. Mas não é uma caricatura académica do sucesso e da qualidade que a comunidade dos estudantes seja representada por alunos, que são sobretudo profissionais do controle, e não exemplos de estudo e de investigação, que são foliões das gatas, a quem uma dúzia de anos ainda não bastou para a conclusão de uma licenciatura?

A Universidade do Minho é, sem dúvida, uma grande Universidade. E continuará a sê-lo, assim o esperamos. Mas sê-lo-á apenas se procurar o futuro na convergência efectiva de docentes, alunos e funcionários, e com o respeito pela vontade que maioritariamente nela se for afirmando.