Sobre a Eleição dos Reitores
Moisés de Lemos Martins
in PUBLICO, 11.06. 2006
in PUBLICO, 11.06. 2006
Por estes dias, ocorreu a eleição do reitor da Universidade do Porto e foram também as eleições para reitor da Universidade do Minho. Há uns tempos, foi eleito o reitor da Universidade Clássica de Lisboa. Nos termos da lei da autonomia da Universidade portuguesa, um reitor é sempre eleito mediante um colégio de representantes. São mais de duzentos os membros do colégio eleitoral da Universidade do Porto, que é a maior academia do país. Mas a assembleia eleitoral da Universidade do Minho tem apenas noventa eleitores, numa comunidade académica de cerca de dezassete mil elementos.
Os actos eleitorais fazem-se acompanhar de recorrentes críticas a um sistema de representação que impede a comunidade académica, no seu conjunto, de exprimir através do voto a vontade que tem sobre as propostas de governação que lhe são apresentadas. E o desconforto é maior quando a maioria dos eleitores pertence ao colégio por inerência e quando as eleições para os representantes dos distintos corpos que constituem a comunidade académica (docentes, alunos e funcionários) se realizam antes de serem conhecidos os projectos concorrentes de governação. Acresce ainda que não existe qualquer garantia de que os representantes cheguem alguma vez a auscultar aqueles que representam.
Convivemos hoje com o sentimento de que a nossa democracia passa por uma profunda crise de representação. Para combater este sentimento, cada vez mais generalizado, e tendo em vista credibilizarem-se diante da opinião pública, partidos políticos como o PS e o PSD entenderam fazer eleições directas para elegerem os seus líderes. Acontece também que, por idênticas razões, as universidades espanholas, que até há pouco tempo elegiam os seus reitores em colégio, fazem-no agora através de uma votação universal, ponderada, da generalidade da comunidade académica de docentes, funcionários e alunos.
Entre nós, os reitores em exercício costumam chorar piedosas lágrimas de crocodilo, endossando para a actual lei da autonomia universitária a responsabilidade das votações em colégio para a eleição do reitor. Uma questão de fundo, todavia, se coloca: o que é que têm feito os reitores para que o legislador altere a lei? Desconheço quaisquer tomadas de posição públicas do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) sobre esta matéria. E também não vi nunca um reitor em exercício pronunciar-se a favor de eleições por voto universal ponderado para reitor.
Mas é de estranhar que o CRUP não tenha esta preocupação. As universidades são, em grande medida, instituições pedagógicas. Nestas circunstâncias, não se entende que, em regime democrático, o projecto pedagógico universitário não passe pela pedagogia da cidadania. Uma Universidade não pode deixar de ser uma escola de virtudes cívicas. E permitir que o debate académico sobre o seu governo possa ser sem consequências para a decisão a tomar na escolha do reitor é uma demissão pedagógica. Uma Universidade apenas tem a ganhar com escolhas de governo que concitem a mais alargada participação da comunidade académica. Confinada, todavia, a um colégio eleitoral restrito, a Universidade fica à mercê das lógicas enviesadas da tomada de poder e vê ficar inquinado um processo que é decisivo para lhe fixar o rumo.
Professor da Universidade do Minho, ex-candidato a Reitor